Roda de Samba

Quem é o dono do samba?

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Nos bons tempos de Virada Cultural, Tom Zé fez um show no Teatro Municipal. Foi um espetáculo em diversos sentidos: da fila quilométrica ao local em si, num Centro ainda frequentável nas madrugadas. Tom Zé, elétrico como sempre, mais falava do que cantava – o que chateou demais uma moça (desavisada?) da plateia, que começou a discutir com o artista no meio da apresentação e foi embora. Coitada, perdeu o que viria a seguir. Cantando (ou falando) um dos seus sambas, Tom Zé começou a gritar um questionamento que marcou a noite: “Quem é o dono do samba? Eu sempre fiz sambas e nunca ninguém me chamou de sambista! Eu quero saber: quem é o dono do samba? Com quem eu tenho que falar? Chico Buarque? Martinho da Vila? Quem é o dono do samba”. O show seguiu, junto com a inquietação.

Hoje, 2 de dezembro, é o Dia Nacional do Samba. E Tom Zé segue sem resposta, porque o samba não tem dono. Tem dezenas, centenas de supostos donos. Gente que se apropria, gente que se aproveita, gente que usa pra limpar a imagem. Tem de tudo, mas dono não tem.

Primeiro porque é difícil definir o que é samba. Tecnicamente a gente até consegue. Mas já viu um outro gênero musical com tantos sobrenomes? Canção, reggae, de breque, exaltação, rock, de roda, enredo… é tudo samba! Fora as vertentes, como o pagode e o partido alto, que se misturam e têm uma linha muito fina entre suas diferenças e definições. Outra característica: conhece algum outro gênero musical tão autorreferente? São milhares de sambas que falam sobre o samba, que tentam explicar o que é o samba, cantar suas características e seus personagens. Então, se tantos poetas já tentaram explicar o que é o samba e não conseguiram, não é um texto em rede social que vai conseguir.

Segundo, porque o samba é do povo. Esse dado é impossível de ser comprovado, mas anote aí: o samba é o gênero musical mais popular do Brasil. Isso não está nas paradas e nas listas de melhores de ano que já já vêm aí. Mas está nas ruas. É muito difícil achar uma região desse Brasil que não tenha uma roda de samba, da mais bem organizada a mais improvisada. Da roda microfonada e com som amplificado a dois ou três amigos numa mesa de bar com um pandeiro velho, uma caixa de fósforos e a própria mesa servindo de surdo, tudo isso é samba e você encontra sem muito esforço. Você não encontra uma roda de funk ou uma roda de rock num boteco de esquina. De samba, sim.

Tom Zé pode ser chamado de sambista sim. Qualquer um que faça samba pode. Mas isso traz uma responsabilidade. A cobrança popular pra cima de um sambista que se coloca em evidência é grande e por vezes cruel. O sambista tem que ter proceder, saber chegar e saber sair e ser do povo, entre muitas outras características objetivas e subjetivas. O samba é um universo complexo, mas, ao mesmo tempo, simples. Se alguém te perguntar “quem é o dono do samba?”, comece rebatendo a pergunta com “de qual samba?”.

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