O ano era 2009. Fui com uma colega para fazer uma pauta no Centro de Treinamento do São Paulo Futebol Clube. O assunto não era diretamente ligado ao futebol, era algo sobre preparo físico e o São Paulo, com seus profissionais e equipamentos de ponta, era uma boa fonte. Ao chegarmos, sentimos um clima estranho: muita movimentação para uma tarde de um dia de semana qualquer, principalmente por parte da imprensa. O motivo: exatamente naquele dia, o então treinador Muricy Ramalho caía e, ainda sem um nome definido, Milton Cruz assumia o time interinamente. A movimentação era por conta do anuncio dessa novidade, que seria feito em instantes.
Milton Cruz foi recebido pelos repórteres que ali estavam com tapinhas nas costas, sorrisos e cumprimentos como “grande professor”, entre outros. E essa cena resume como funciona boa parte da cobertura esportiva, especialmente do futebol, no país. A figura do setorista, esse repórter que vive o dia a dia de um determinado clube, perdeu relevância justamente quando começou a se relacionar demais com o objeto do seu trabalho: o time de futebol. Não estou dizendo que todos fazem isso e nem que isso é exclusividade do jornalismo esportivo. O jornalismo cultural taí para mostrar que também se vive de tapinhas nas costas. A cobertura política, então…
Mas se quisermos cobrar mudanças na CBF, na seleção brasileira e em nosso futebol, essa mudança tem que passar pela imprensa e na forma como cobrimos o esporte. Não é raro vermos repórteres que são amigos de jogadores e dirigentes. Por causa do contato diário, eles acabam cortando essa linha tênue entre a missão de noticiar fatos de um time com a amizade e o coleguismo. Mais uma vez: isso é humano, não é próprio de jornalistas esportivos. A solução: a profissionalização do departamento de imprensa dos clubes e o fim do setorista. O clube solta vídeos, fotos e informações do treino, com acesso geral e irrestrito para toda a imprensa. O Barcelona tem um canal de TV em seu site só pra isso. Alguns clubes brasileiros também investiram em canais de TV, mas não conseguem se livrar dos tais setoristas.
Quando soubermos cobrir o futebol de forma adulta, as cobranças pra cima da seleção também serão mais precisas, sem tantos achismos ou com gente querendo aparecer com suas opiniões polêmicas. Um repórter não precisa ser amigo íntimo do treinador para transmitir informações para seu leitor/espectador/ouvinte. Muito pelo contrário: sendo amigo, ele vai filtrar muito mais o que dizer. E isso não cabe numa modernização ou profissionalização do futebol brasileiro.
Foto: Leonardo Soares/Folhapress
Concordo cem por cento
é cara, mas aí vai cair naquele oficialismo que também não é legal. só vai ser divulgada a informação oficial dos clubes.
uma coisa que, se bem me lembro, você mesmo criticou quando o andrés sanchez disse que só valia informação do corinthians no caso do operário que morreu na construção do itaquerão
acho que a mudança é maior do que isso…
Vejo por outro lado. Oficialismo sim, mas também uma mãozinha para que os repórteres investiguem mais. A notícia não vai cair no colo da forma como eles querem. A não ser que se contentem…
O caso do operário é outra coia. É caso de polícia, inclusive.