Saí do Centro de São Paulo. Morei por lá por 32 anos e agora sou um cidadão do Tatuapé. Mas nem por isso, claro, vou deixar de amar e de cuidar do Centro como se fosse meu. E é. Meu e de todos que são cidadãos e vivem suas vidas por essas plagas.
Há algum tempo acompanho a luta pela criação do Parque Augusta. Em frente à 4ª DP há um terreno de cerca de 24 mil metros quadrados que hoje serve uma parte como estacionamento e outra abandonada, com vasta vegetação.
Muitas construtoras e incorporadoras já tentaram comprar o terreno para erguer suas maravilhas da arquitetura. A última proposta foi da Cyrela: R$ 30 milhões. O ex-prefeito Gilberto Kassab, num arroubo de consciência, barrou a negociação entre a construtora e o proprietário do local, Armando Conde, e declarou que o terreno era de interesse público. Isso foi bem no finalzinho do seu mandato. Com a entrada de Fernando Haddad na prefeitura e seu discurso preocupado com a sustentabilidade e uma mente mais aberta, pensei que a luta estava ganha.
Mas nesta terça-feira, segundo matéria do Estadão, Haddad jogou um balde de água fria nos otimistas. Num encontro de vereadores da Frente Parlamentar Pela Sustentabilidade, o prefeito afirmou que o Parque Augusta não é prioridade e que, se tivesse R$ 100 milhões (valor para desapropriação do terreno e construção do parque) faria creches.
Eu entendo Haddad. Ele (e toda a classe política) está aprendendo, junto com a população, a fazer política. Do zero, tudo de novo. E com essa coisa do povo estar na rua, as medidas mais populares serão as mais prioritárias. É claro que dezenas de creches serão mais visíveis e “importantes” (muitas aspas) do que um parque no centro de São Paulo. Agradar a milhares nas periferias ou centenas no centro? Milhares, é claro.
Mas a administração pública não funciona assim – ou pelo menos não deveria. Por vezes, uma medida importante agrada a menos gente. E essa região da Augusta está sofrendo com as dezenas de novos empreendimentos imobiliários que estão lotando as ruas mais do que elas já são lotadas. Em breve, moradores da Augusta pegarão congestionamento nas garagens dos seus prédios. Ali mesmo, logo ao lado do futuro parque (ou ex-parque, vai saber), onde funcionava o Hotel Cad’oro, já erguerão belíssimas torres de concreto para movimentar um pouquinho mais aquela região já judiada pelo dia a dia.
Então, Haddad prefere ir pro jogo ganho, pro popular, em vez de tentar salvar pelo menos um pedacinho de mata atlântica que ainda temos no centro de São Paulo. 24 mil metros quadrados fazem a diferença quando são conservados de maneira responsável. Já não bastam os casarões históricos que caem dia após dia para erguerem prédios? Querem também derrubar o que já está no chão, o que nos resta de chão.
Alguns vereadores ainda tentarão reverter o jogo e usar o dinheiro pago pelas construtoras dos outros novos prédios da própria Rua Augusta para bancar o parque, o que seria algo espetacular. Se ergue um prédio ali, que pelo menos ajude a manter um parque por perto. Os Aliados do Parque Augusta também continuam de olho nas movimentações – dá pra se informar pela página no Facebook. E eu, agora da zona leste, também vou ficar de olho. A Augusta e o centro de São Paulo merecem um parque pelo tanto que já sofreram.
Foto: reprodução/Facebook dos Aliados do Parque Augusta
Obrigado, Marcos Lauro! Mesmo distante suas colocações são preciosas, lúcidas, consistentes e objetivas. Tudo que precisamos neste momento de ignorância ambiental e falta de visão urbana da atual gestão, que retrocede ao invés de evoluir, por ter em mente outros interesses que não o de melhorar a vida do cidadão paulistano.